Lula saiu de sua visita a Fidel confiante de sua recuperação e posterior volta ao cargo de presidente de Cuba. Deve ter sentido um baque profundo com a escolha de Fidel não mais retornar ao poder. Deve ter se indignado, já que um homem que teve o poder durante tantos anos, nesse ponto da vida resolve largá-lo. Deve até ter pensado: “Ai! Ai! Companheiro Fidel! Uma chance dessas eu não perderia nunca!”.
“...Desempenhei o honroso cargo de presidenteao longo de muitos anos. Em 15 de fevereiro de 1976, foi aprovada a Constituição Socialista pelo voto livre, direto e secreto de mais de 95% dos cidadãos com direito a votar. A primeira Assembléia Nacional foi constituída em 2 de dezembro desse ano e elegeu o Conselho de Estado e sua presidência. Antes, eu havia exercido o cargo de primeiro-ministro durante quase 18 anos.”
Fidel afirma que nada o honraria mais que exercer o cargo de presidente de sua nação, Cuba. Afirma ainda que a partir de 1976, após 18 anos como primeiro-ministro, convocou assembléias, para que o povo exercesse sua preferência de governante, e ela foi exercida. Fidel continuou no poder. E por aí foram mais quase 30 anos.
“...Sempre dispus das prerrogativas necessárias para levar adiante a obra revolucionária com o apoio da imensa maioria do povo...”
Fala-se muito da hipocrisia cubana. Muitos criticam o sistema Cubano dizendo que lá os ricos podem tudo enquanto os pobres que se lasquem, ao mesmo tempo em que se invejam dizendo que o filho de Fidel e o filho de seu faxineiro estudam na mesma escola recebendo a mesma educação. Em qualquer lugar que tenha poder, o detentor do poder terá regalias, e usufruirá delas, isso é natural.
Fidel pelo menos sempre foi coerente com suas idéias, e em quase 50 anos de poder, 49 para ser mais exato, nunca fugiu de seus ideais políticos. Apesar do comunismo ter vindo por água abaixo com o fim da guerra fria. Apesar de seu maior colaborador, a União Soviética, hoje desmembrando-se todos os dias em inúmeros países menores (mais recentemente tivemos a independência de Kosovo, que foi revogada pelo parlamento sérvio), e a China, que ainda vivia sob resquícios do comunismo abrir as portas ao capitalismo, continuou firme em sua ideologia, que dita em suas palavras, "Não há comunismo nem marxismo em nossas idéias, só democracia representativa e justiça social".
Lula mal entrou no poder, e tudo o que ele combatia, passou a fazer. Todas as suas batalhas contra os governantes se vêem estampadas nele. Isso sim é hipocrisia.
“...Conhecendo meu estado crítico de saúde, muitos no exterior pensavam que a renúncia provisória... era definitiva... Era incômoda minha posição frente a um adversário que fez todo o imaginável para se desfazer de mim, e em nada me agradava satisfazê-lo...”
Com certeza não estava nos planos de Fidel deixar o poder. Afinal quem mais importunaria os EUA tão magistralmente como ele? Quem traria tanta desconfiança e medo a qualquer dirigente norte-americano que não ele?
Além de já ter noção de que sua volta seria muito improvável, sabia que o mundo todo torcia para que isso acontecesse, e em especial o “adversário que fez todo o imaginável para desfazer-se dele”, os EUA. Ele não queria, no entanto, deixar o mundo sorrindo em cima de sua desgraça.
“...Mais adiante pude alcançar de novo o domínio total de minha mente... Me acompanhavam as forças físicas suficientes para escrever durante longas horas... a nosso povo no meio da batalha. Prepará-lo para minha ausência, psicológica e politicamente, era minha primeira obrigação depois de tantos anos de luta... Meu desejo sempre foi cumprir o dever até o último alento. É o que posso oferecer...”
Fidel sabia que não conseguiria mais voltar. Então porque, desde Agosto de 2006 mantê-se afastado e não convocou logo essas eleições, que acontecerão daqui 30 dias? Um ato declarado de tirania? Não. Fidel já não estava desejoso de voltar ao poder, face à sua impossibilidade. Sabia que escrevendo as “reflexões do companheiro Fidel” seria de tanta valia ao povo, como quanto se estivesse no papel de líder.
Fidel queria, primeiro preparar seu povo para sua partida. Uma partida brusca causaria um alvoroço na população. Com certeza quem assumiria o poder seria alguém totalmente alheio a ele e sua linha de raciocínio. Talvez uma minoria inconformada.
O principal erro de quem liderou anos a fio foi não preparar o povo para sua ida. Foi morrer e deixar o povo ao alento. Fidel vem preparando o povo para se acostumar à idéia de que ele já não pode mais exercer a presidência e em breve os estará deixando. Com isso, há aproximadamente dois anos seu irmão vem tomando seu papel e mostrando ao povo que saberá liderar como o próprio irmão. Trazendo uma tranqüilidade.
“... A meus queridos compatriotas, que me deram a imensa honra de ser eleito em dias recentes como membro do Parlamento, em cujo âmago se devem adotar acordos importantes para o destino de nossa Revolução, lhes comunico que não aspirarei nem aceitarei --repito-- não aspirarei nem aceitarei o cargo de presidente do Conselho de Estado e comandante em chefe...”
Com certeza o ponto mais importante da carta. Fidel não renuncia ao cargo. Não larga seu povo ao léu. Ele simplesmente convoca novas eleições e abdica da escolha que o povo anseia fazer. Simplesmente pede veementemente que não seja eleito. Que deseja descansar.
“...Trairia portanto minha consciência ocupar uma responsabilidade que requer mobilidade e entrega total, que não estou em condições físicas de oferecer. Eu o explico sem dramatismo...”
Fidel tem plena consciência do que um governante necessita para governar, e sabia que suas condições em nada o ajudariam frente seu povo. Um governante de consciência exemplar, sabendo que não deve permanecer até o fim, mas deve permanecer até onde conseguiria se fazer ouvir, e se fazer respeitar. Ele poderia muito bem permanecer por mais um ano, e completar meio século de liderança absoluta. Mas não o quis. Soube o que seu povo necessitava.
“...O adversário a derrotar é notavelmente forte, mas o temos mantido a distância durante meio século...”
Não poderia ter dito melhor. Os grandes líderes e as grandes nações sempre acharam que sabiam o que seria melhor para os países mais fracos, durante toda a história sempre foi assim. Os países “civilizados” de hoje sempre acharam que sabiam o que era melhor para países como Cuba, Iraque, e várias outras civilizações. Talvez acertem algumas vezes. Mas estão condenados a errarem também.
Fidel entrou no poder e lá permaneceu para acabar com o regime de Fulgêncio Batista. Assim como Fidel não foi o primeiro a ter a idéia de fazer uma revolução, não foi o último. Permaneceu no poder em Cuba por 49 anos, e nunca ouve uma revolução para que o tirassem do poder. Mesmo que houvesse revoluções silenciosas, ou abafadas pelo governo, porque nenhum nunca deu certo? Porque o povo nunca se rebelou contra Fidel? Se ele chegou aonde estava por meio de revolução, com certeza uma revolução também conseguiria tirá-lo do poder. Talvez não, se levarmos em conta o fato de que nem os EUA o tiraram de lá.
Mas a parte mais forte sempre achou que sabia o que era melhor aos mais fracos. O povo em Cuba tem educação e saúde de última geração, comparável a países ditos civilizados, e vivem num país tido como retrógrado.
O que é uma vedação à liberdade de expressão, se aqui, diferente de lá, o povo entra em um hospital e vê filas enormes, onde a maioria desse povo pobre sabe que não será sequer atendido? O que é a proibição de venda de produtos diferentes do permitido pelo governo se as crianças estudam de verdade ao invés de ir à escola só pra mãe ganhar o bolsa escola e depois ir à rua pedir dinheiro?
Que mal faz um Fidel Castro no poder por 49 anos em comparação a um Luiz Inácio “Lula” da Silva no seu segundo mandato?
O mundo sempre achou que sabia o que era melhor ao povo cubano sem perguntá-los o que eles queriam.
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Um comentário:
Muito bom, Parabéns...
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